sexta-feira, 11 de junho de 2021

Reflexão sobre a Preguiça (Parte II)

 
Esta é a continuação da reflexão que pode ser acessada clicando aqui:Reflexão sobre a Preguiça (Parte I)

A partir da reflexão anterior, chegamos ao ponto de que a preguiça é um fenômeno psíquico através do qual o impulso de ação é ativamente limitado ou repelido.

Partindo do pressuposto da eficiência da psique humana, nenhum fenômeno psíquico é criado sem que haja necessidade para tal, pois representaria um gasto desnecessário de um recurso finito e que tem um objetivo específico, nossa individuação. Se nossa psique cria um mecanismo que age ativamente para impedir a ação, deve haver alguma razão.

Retomando a reflexão anterior sobre orgulho (pode ser acessada clicando aqui Reflexão sobre o Orgulho (Parte I) e aqui Reflexão sobre o Orgulho (Parte II)), assumirei que a preguiça também funcione como um mecanismo de defesa psíquica. Mas não uma defesa do cansaço em si, pois isso seria natural e até benéfico, mas de um desgaste imaginado ou pressuposto que não necessariamente está calcado na percepção do real ou do agora, ou que está superestimado.

 


Analisando como a preguiça age em mim, percebo que as situações em que a preguiça mais me afeta são exatamente aquelas nas quais eu precisaria me expor mais do que eu gostaria. Não é, necessariamente, a ação em si que estou evitando, e sim o envolvimento intelectual ou emocional com aquela questão e, eventualmente, precisar revelar meus valores, ideias e minha visão de mundo, me colocando numa posição de vulnerabilidade diante do mundo.

Aprofundando ainda mais, as situações mais críticas são aquelas que desafiam habilidades que considero que não tenho ou que sei que estão mal desenvolvidas. A preguiça parece ser, dessa forma, meu escudo contra o confronto com meus limites.

Nesse sentido, a preguiça parece exercer em mim o papel da inércia na mecânica dos corpos, uma força que me faz permanecer no estado atual, de não movimento. Por analogia, imagino que em outras situações a força da preguiça me mantenha em movimento contínuo, de forma que não consiga, de fato, parar para refletir sobre o que estou fazendo. Essa segunda manifestação costuma acontecer em aspectos específicos da minha vida, principalmente relacionados à práticas e estudos espirituais.

Acredito ser possível entender, então, a preguiça como sendo o reflexo do desequilíbrio da disposição para refletir, reavaliar e, caso necessário, modificar padrões, ideias e sentimentos. Neste sentido, acaba sendo uma peça chave nos processos de auto aprimoramento.

Se, como resultado lógico da reflexão posta, temos que a preguiça é uma força relacionada com nosso contato com nossos limites, uma espécie de guardiã dos nossos limiares, das bordas de nós mesmos, acredito que esta seja uma chave importante para como trabalhar essa energia.

Cruzar o limiar parece tentador, possibilita o contato com o desconhecido, com o que está além do véu, ao mesmo tempo que abre caminho para que nos percamos na multiplicidade de possibilidades (caos absoluto). Se há uma sentinela que protege essa passagem, precisamos aprender a lidar com ela, negociar nossas passagens, sempre precavidos contra as adversidades que possamos encontrar.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

Reflexão sobre a Preguiça (Parte I)

Quando ouço a palavra preguiça, a primeira imagem mental que me vem (além do fofíssimo bicho-preguiça, claro) é a de estagnação, falta de movimento, um estado de espírito no qual não há ímpeto de ação. 


Buscando na memória, a preguiça evoca diversos momentos nos quais essa não-ação é enxergada como algo inerentemente natural, prazeroso e sadio (“uma tarde preguiçosa de chuva”, “uma rede preguiçosa pra deitar” etc). No entanto as considerações negativas sobre a preguiça são muito mais abundantes, sendo que diversas palavras que estão em seu campo semântico são utilizadas como xingamento, como vagabundo, vadio etc.

Partindo disso, me surgem duas perspectivas para seguir com a reflexão. Na primeira a preguiça se originaria da ausência de movimento, de forma passiva, quando não há estímulo suficiente. Na segunda a origem é a aversão (e não a simples ausência) de movimento, sendo que neste caso a preguiça adquire um caráter ativo, pois mesmo diante da possibilidade de ação, há uma força intrínseca que a anula.

Como ponto de partida, partirei do entendimento da preguiça como sinônimo de não-ação. Também irei considerar que essa tipificação da preguiça como ativa e passiva, baseada na aversão ou na simples ausência de ação, seja relevante.

A não-ação faz parte dos fenômenos naturais observáveis, sendo de vital importância para os processos naturais. São momentos interciclos, nos quais as condições para reinício estão sendo gestadas. Tomo a liberdade de citar as palavras de Mauro Iasi, em seu poema Aula de Voo, quando diz que “para o voo é preciso tanto o casulo como a asa”. Assim são os momentos que podemos ver no inverno, na lua nova, nas entre-safras etc. 

Considerando que a humanidade, assim como toda a criação divina, foi feita à imagem e semelhança de Deus, podemos partir da análise que os ciclos naturais refletem a natureza divina e, de forma análoga, também dos seres humanos. Se a natureza tem seus ciclos de ação e não-ação, desta forma, podemos entender que com a humanidade também acontece o mesmo. 


Porém, é importante levar em conta que estes momentos de não-ação são, via de regra, menores que os de ação e que o mesmo deve ser verdade para os seres humanos. Os momentos de descanso precisam ser menores do que os momentos de trabalho.

Além disso, é vital que lembremos que não-ação absoluta é impossível. Sempre estamos em algum tipo de movimento, mesmo que seja um movimento ativo e consciente de conservação de energia ou defesa contra possíveis ameaças.

Desta forma, me parece insuficiente a associação da preguiça com os momentos de não-ação, uma vez que, sendo um conceito típico da natureza psíquica humana, não pode ser ligado aos fenômenos naturais de forma tão automática. Em outras palavras, a não-ação é natural e saudável, mas a preguiça não o é necessariamente, visto que não são da mesma natureza.

O que define, então, a preguiça? Qual sua natureza última? E, principalmente, o que faz com que seja considerada por muitas tradições espiritualistas e religiosas como um defeito capital?

Retomarei aqui a divisão inicial entre a preguiça passiva e ativa, com base na ausência ou na aversão à ação. Se a ausência de ação é natural e faz parte integrante dos ciclos naturais, sendo, como já visto, de outra natureza em relação à preguiça, a associação entre essas duas coisas não me parece, de fato, válida. Assim, a ideia de preguiça está intrinsecamente ligada à sua forma ativa (na verdade sua única forma), na qual o fator definidor é a aversão ou recusa à ação e ao trabalho.

Acredito ter chegado num ponto importante da reflexão, porém essa ideia ainda não explica como a preguiça se origina, como age na psique humana e, o mais importante, como combatê-la.

Na continuação desta reflexão, tentarei desenvolver estas ideias. Até lá.

domingo, 4 de outubro de 2020

Preciso me (re)encontrar!

 Fazendo jus ao título do blog, acredito que tenha chegado o momento para um novo passo  no meu caminho. Nos últimos meses algumas ideias e paradigmas que orientavam minha visão de mundo e que se refletiam nos meus estudos, práticas e anseios criativos deixaram de ocupar o papel central em minha vida. 




Desta forma, usarei o blog para tentar elaborar sobre essas novas perspectivas espirituais e filosóficas que me têm sido apresentadas. Provavelmente precisarei revisitar alguns (ou todos) artigos e reflexões apresentados até aqui. Isso me deixa um tanto quanto ansioso e desconfortável, mas acho que será mister nesse processo de reencontro comigo mesmo.

Novamente, convido a quem se interessar para me acompanhar nessa jornada.

segunda-feira, 29 de junho de 2020

As linhas de trabalho na Umbanda (parte I)

Os espíritos que se manifestam na Religião de Umbanda para realizar o trabalho caritativo se dividem, segundo seu nível vibratório, em diversos agrupamentos que formam uma cadeia hierárquica de comando, lembrando a organização militar. 

A primeira grande divisão dos espíritos é entre as polaridades da Direita e da Esquerda. Para entender sobre essa divisão acesse o artigo Direita e Esquerda na Umbanda.

A Segunda divisão organiza os espíritos em Linhas de Trabalho. Caboclos, Pretos-velhos, Erês, Exús e Pombogiras são, provavelmente, as linhas mais conhecidas, inclusive por não praticantes da Religião. 

Além destas temos os Baianos, Boiadeiros, Marinheiros, Ciganos, Malandros e Exús-mirins como linhas bastante conhecidas, mas que não estão presentes em todos os terreiros. Temos ainda linhas como o Povo do Oriente, os Cangaceiros, os Piratas e os Africanos, que apesar de presentes em muitos terreiros, não são completamente vistas como linhas de trabalho propriamente ditas. 

Por último, temos linhas originárias de outros sistemas de crenças que acabam se manifestando nas giras, devido à abertura dos e das comandantes astrais das casas. Podemos citar a linha dos Médicos, dos Frades (Semiromba), dos Mestres e Mestras da Jurema, entre outras.

As linhas de trabalho são compostas por espíritos que se apresentam em arquétipos presentes no inconsciente coletivo, plasmando seus corpos astrais com determinadas características simbólicas escolhidas para facilitar a transmissão de determinados ensinamentos, mas que não representam, necessariamente, encarnações passadas vividas pelos espíritos.

Linhas de trabalho na Direita


Nas linhas de trabalho da direita, os arquétipos apresentados representam povos, etnias e grupos sociais marcados por seu modo de vida, seu código de ética, sua visão de mundo e por sua história social próprios, que os colocam apartados da sociedade ocidental, e que expressam um corpo ideológico e um conjunto de conhecimentos únicos e inerentes àqueles grupos.


Desta forma, quando falamos da linha dos caboclos, estamos falando dos povos ameríndios, de sua relação com a terra e com a natureza, sobre caça, pesca, coletas de alimentos nas matas, sobre agricultura natural. Estamos falando, ainda, de organização tribal, na qual a divisão de tarefas é clara e todos sabem o papel que devem desempenhar para o bem da comunidade. O mesmo acontece com todas as demais linhas. 


Se quisermos nos aprofundar na simbologia, nos ensinamentos e na proposta de trabalho de cada uma das linhas, precisaremos entender como os povos que embasam estes arquétipos vivem (ou viviam).

As linhas que tradicionalmente compõem a direita são: caboclos, boiadeiros, pretos-velhos, erês, baianos, marinheiros, ciganos e malandros.

Linhas de trabalho na Esquerda

Se entendemos que a esquerda trabalha nas trevas para trazer a luz, entendemos que as entidades que realizam este trabalho precisam usar de energias específicas de proteção para não se contaminarem com as energias ambientais. E que, assim como nas profissões humanas que lidam com situações extremas, necessitam de muito preparo e condicionamento mental. 

Quem realiza este trabalho são os Exús (também chamados de Guardiões, ou Compadres), as Pombogiras (Guardiãs, Moças ou Comadres) e os Mirins (Exú-Mirim e Pombogira-Mirim).

Ao contrários das linhas da direita que apresentam arquétipos fundamentados em grupos étnico-sociais específicos, que nos ensinam sobre a ética e visão de mundo próprios de seu povo, na esquerda o arquétipo base são os homens e mulheres da nossa própria sociedade, que, por qualquer motivo, não se enquadravam dentro da ordem social estabelecida.

Estes arquétipos destoantes e subversivos são bem mais abrangentes que os da direita, comportando espíritos de diversas etnias, origens, classes sociais, graus de escolaridade, religiões, profissões etc.

É através das linhas da esquerda que serão introduzidos na Umbanda conhecimentos místicos, esotéricos e mágicos de sistemas mais formalizados (escolas de mistérios).

Findada este breve introdução, na próxima parte serão iniciadas as descrições das linhas.

Até lá.

quarta-feira, 24 de junho de 2020

Abram caminho para o rei Xangô

Dia 24 de junho é um dos dias escolhidos para homenagear Xangô na Umbanda. A data se deve ao sincretismo com São João Batista. Essa associação se dá com a qualidade jovem de Xangô, o senhor do Fogo e do Trovão, cuja representação principal é a fogueira. 

Podemos entender o fogo como o caráter impetuoso, corajoso e devastador do jovem rei guerreiro, que quer ampliar e consolidar seu reinado e cuja fúria é letal para seus inimigos.

Na Umbanda estamos mais acostumados com a figura do Xangô mais velho, sincretizado com São Jerônimo, que representa os arquétipos do juiz e do rei justo e provedor, aquele que garante a subsistência do grupo.

Essas duas faces da mesma força nos ensina uma lição preciosa: é do ímpeto do jovem guerreiro que nasce a sabedoria do legislador. Isso lembra aquela história de um mestre zen que teria dito a seu discípulo que as boas escolhas são provenientes da experiência, e que esta é proveniente de más escolhas.



A chave que nos é dada por Xangô é a da transformação do ímpeto e da fúria juvenis em sabedoria equilibradora, fonte de justiça pra nós e para a comunidade ao nosso redor.

Que nosso Pai Xangô nos ajude a sermos cada vez mais justos em nossas ações, sentimentos, pensamentos e intenções. 

Kaô Kabecilê!

Pra finalizar, segue a excelente letra da canção Obá Iná, de Douglas Germano, para louvação de nosso Pai Xangô


Abram caminho para o rei
Sorriam em vez de se curvar
Ele é justiça, ele é a lei
Que fez pra nos levantar

Pra nos por em pé, nos erguer
E lançar pra Orum nosso olhar
Não há justiça se há sofrer
Não há justiça se há temor
E se a gente sempre se curvar

Kaó kabiecilè Xangô oba iná

Abram caminho para o rei
Que se anuncia em um trovão
Que bravo, escreve o que errei
Cuspindo fogo pro chão

Labareda pra eu me consertar
Fogo pra me aquecer de perdão
Não há justiça sem ceder
Não há justiça sem amor
E se a gente nunca se entregar


Kawó kabiecilè Xangô oba iná

segunda-feira, 8 de junho de 2020

Reflexão sobre a Mente, a Realidade e a Liberdade (Parte I)

Quem não se movimenta, não sente as correntes que o prendem. 
Rosa Luxemburgo


Ao longo da jornada da humanidade, desde que os seres humanos se percebem como seres conscientes, diversas foram as tentativas de explicação sobre a natureza humana, sobre o mundo ao seu redor e sobre o pós-vida. Mais tarde, estas questões deram luz à outras ondas de questionamentos, como sobre o funcionamento da mente humana, sobre o que é ou não real, se há forças externas que controlam a vida humana, entre muitas outras. 

Partindo de diferentes perspectivas, a religião, a magia, a filosofia e a ciência buscaram responder estas e outras questões, chegando a respostas aparentemente discrepantes que deram luz à modos de pensar divergentes, o que não contribui para alcançarmos o que poderia se caracterizar como a resposta definitiva. 

A religião tem por fundamento fazer a reconexão da humanidade com a grande força criadora do universo, que chamarei aqui de Deus, transmitindo seus ensinamentos às massas através de dogmas, ritos e crenças uniformes.

A magia pretende despertar no homem suas potências divinas, para que este seja capaz de modificar sua realidade por meio de sua vontade, o que exige conhecimento amplo nas diversas áreas de conhecimento disponíveis, capacidade de adaptar e estes conhecimentos para novas formas e um não-apego a paradigmas limitantes.

A filosofia se baseia no desenvolvimento humano através da capacidade crítica, analítica e racional, baseando-se nos estudos teóricos sobre a natureza humana e na relação dos homens com os elementos externos (desde outros homens até uma figura como Deus).

A ciência visa a construção de conhecimentos amplamente verificáveis, reproduzíveis, fazendo uso do método científico para validação de dados e elaboração de conhecimentos mais complexos.


Mesmo estes diferentes caminhos já expressaram entendimentos diferentes em épocas distintas. Essa adaptação é natural, pois a realidade é dinâmica, assim como a percepção humana sobre si mesma e sobre o mundo. A ciência adquire novos conhecimentos, a religião se adéqua aos novos membros, a magia se reinventa e a filosofia aprofunda cada vez mais suas questões fundamentais; essas mudanças são causa e efeito das mudanças sociais; as sociedades humanas adquirem novas formas de funcionamento.

Cada um desses caminhos, ou outros que possam existir, se volta para uma parte específica da análise da realidade (interna e externa do homem), sobre a qual consegue se aprofundar e estabelecer um caminho para que seus adeptos possam trilhar de forma segura.

Em todos os casos, me parece que há uma ideia inata, porém nem sempre explícita, de conferir aos homens ferramentas para que se tornem capazes de tomar decisões sobre sua vida. Me parece, ainda, que o objetivo final seja o de atingir a liberdade para conduzir sua própria vida. Esse será o ponto central que conduzirá esta reflexão.

Nossa liberdade é diretamente proporcional à nossa capacidade de tomar decisões conscientes sobre nossas ações. Para isso, é preciso que saibamos as leis e forças (físicas, jurídicas, culturais etc.) que nos regem e que implicam nas possíveis consequências de nossas ações. 

Desta forma, seja através de dogmas, paradigmas, teorias, crenças ou tabus, cada um dos caminhos de desenvolvimento humano nos ensina a tomar decisões e poder agir livremente, pelo menos dentro do padrão de liberdade enxergado como ideal.

Só podemos escolher entre as opções viáveis, no tempo e no espaço, daquilo que nos é dado à escolher. Também é verdade que só podemos verdadeiramente escolher quando compreendemos todas as variáveis envolvidas, incluindo nossa própria vontade.

Nossas escolhas, fator principal da liberdade, são dependentes da forma como entendemos o mundo e esta, por sua vez, é dependente das ideias, emoções, instintos e animações que povoam nossa mente.

Pensamentos não estão isentos de valores, eles carregam mensagens importantes sobre como percebemos o mundo, e se configuram como hipóteses, ou seja, uma das possíveis interpretações da realidade, não a verdade absoluta. 

Nossa mente não percebe a realidade em si, mas sim como os acontecimentos nos afetam. A percepção da realidade é filtrada, primeiro pelos receptores físicos, depois por nossa bagagem cognitiva de cunho intelectual e por último por nosso conjunto de memórias, traumas, crenças e valores. Estes filtros de realidade influenciam a forma como percebemos o ambiente ao nosso redor, os acontecimentos em nossa vida e, por fim, a nós mesmos.

Os filtros de realidade não são, inicialmente, construídos por nós. Eles são frutos de nossas experiências desde a mais tenra idade e, caso não haja intervenção, dominarão nossa mente e nossa realidade até o fim de nossas vidas.

Dessa forma, para alterar nossa visão de mundo, alterando nossa capacidade de realizar escolhas conscientes e, por fim, alcançar nossa liberdade, precisamos antes modificar nossos filtros de realidade. Este trabalho não acontece de uma hora para outra, precisando ser feito de modo contínuo, responsável e respeitando nosso próprio ritmo. 

Como só percebemos o que conhecemos, não somos capazes de perceber coisas muito distantes de nossa compreensão. Dessa forma, a expansão deve começar a partir de conteúdos mais próximos à nossa realidade, porém que já possam apresentar pontos de inflexão e ruptura de valores cristalizados. Depois estaremos aptos a absorver conteúdos cada vez mais distantes de nós.

Porém não podemos modificar o que não conhecemos. Os mecanismos de percepção da realidade são, em grande parte, inconscientes, sendo necessário um processo de aprofundamento em nossa própria mente para começarmos a identificá-los. Por isso é mais fácil, inicialmente, mapear nossas emoções e atitudes espontâneas do que o pensamento em si. A partir daí, podemos fazer o caminho inverso, até sermos capazes de chegar aos filtros mais profundos. 

A chave para entendermos nossos filtros mais aparentes está na observação da repetição de emoções e atitudes. Em que situações sou dominado pela raiva, ou pela tristeza, ou pela alegria? O que estas situações têm em comum. o que desperta estas emoções em mim?

Reconhecer os pensamentos e ideias que se repetem é pré-requisito para termos a capacidade de controlar e eliminar aqueles que não nos pertencem e que atrapalham nosso processo de conquistar a autonomia sobre nós mesmos.

Na próxima parte tentarei trazer alguns ensinamentos trazidos pela Tradição Hermética que podem nos ajudar a entender melhor esse processo.

Até lá

segunda-feira, 25 de maio de 2020

Os orixás na Umbanda (parte III)

Este texto é a terceira e última parte da apresentação dos Orixás na Umbanda. A primeira e segunda partes podem ser acessadas aqui: Os Orixás na Umbanda (Parte I) e aqui Os Orixás na Umbanda (Parte II) , respectivamente.

Após a introdução, e as descrições sobre os Oborós (Orixás masculinos), seguem as descrições das Yabás (Orixás Femininos) mais comumente cultuadas na Umbanda. As informações apresentadas podem variar conforme as diferentes doutrinas.


IANSÃ
Orixá dos ventos e das tempestades, Iansã é a senhora das nuvens de chuva, aquela que direciona o que receberá, ou não, as águas celestes (emoções e sentimentos superiores).


Sua energia é impulsionadora, expansiva, disciplinada ao mesmo tempo intempestiva. Ela agita o que está parado, derruba o que não tem raízes, revela o que está oculto, destrói aquilo que não é essencial, transmutando pelo fogo, para o novo renasça.


Traz os arquétipos de mãe disciplinadora e de Guerreira. Com sua espada e escudo em mãos, nos ensina a lutar por tudo o que acreditamos ser o certo.  Por estar ligação à energia de mudanças bruscas, tende ao exagero no uso de força, à falta de tato social, e a dificuldade de lidar com rotinas repetitivas.



Cores: amarelo / vermelho / laranja / rosa
Sincretismo: Santa Bárbara
Elemento: ar, fogo e água (chuvas)
Pontos de força: bambuzais e campos abertos.
Domínios: movimento, transformações, estímulo, quebra de padrões cristalizados
Símbolo: Espada, chifre de búfalo e iruquerê (abanador feito da cauda de cavalo)
Ervas: espada de Santa Bárbara, pára-raio, eucalipto, pitangueira, laranjeira
Saudação: Eparrei Oyá!


OXUM
Orixá das águas doces, Oxum é a senhora da fertilidade, do amor e do prazer. Representa os aspectos benéficos das águas, que matam a sede, abrandam o calor e regam as plantações. 


Sua energia é alegre, animadora, amorosa, delicada e muito autoconsciente. Com seu espelho voltado para si, nos ensina a olhar pro mais profundo de nós e a amar tudo o que vemos nele refletido.


Representa os arquétipos da mulher jovem e da musa inspiradora. Dona do ouro, das pedras preciosas também a elegância, a riqueza e a beleza, mostrando que os prazeres da vida precisam ser apreciados. Por carregar energias ligadas à beleza, ao prazer e as emoções, pode desviar-se para a vaidade, a luxúria e a manipulação emocional.


Cores: amarelo (ou  dourado) / cor de rosa / azul escuro 
Sincretismo: Nossa Senhora da Conceição / Nossa Senhora Aparecida
Elemento: água doce
Pontos de força: rios e cachoeiras
Domínios: amor, prosperidade, fertilidade, elegância, gestação e maternidade
Símbolo: Abebê (espelho) dourado
Ervas: rosas, camomila, erva-doce, artemisia, malva, lírio do brejo
Saudação: Ora Yeyé ô!  / Aieieô!


IEMANJÁ
Orixá das águas salgadas, Iemanjá é a senhora da vida, da maternidade e do acolhimento. Com seu espelho voltado para para fora, nos ensina a olhar os demais como realmente são, aceitar e acolher tudo o que ali esteja refletido.


Sua energia é criativa acolhedora, cuidadosa, receptiva, tranquilizadora. Iemanjá rege a harmonia familiar, seja entre os parceiros, seja entre pais e filhos ou todos que formam laços sentimentais profundos (família do coração).

Representa os arquétipos da mãe cuidadosa e da rainha abnegada. Mãe de todos os peixes, a quem criou para que sua casa nunca esteja vazia e sempre tenha a quem cuidar. Por estar ligada ao cuidado com o outro, pode facilmente negligenciar a si mesma e sobrecarregar quem está sob seu cuidado.

Cores: branco / prata / azul claro
Sincretismo: Nossa Senhora dos Navegantes / Nossa Senhora da Candeias
Elemento: água salgada
Pontos de força: mar, grandes rios, grandes lagoas
Domínios: maternidade, geração, família, saúde mental, acolhimento, hospitalidade 
Símbolo: Abebê (espelho) prateada
Ervas: rosa branca, pata de vaca, manjericão, erva de bicho, alfazema 
Saudação: Odoyá! / Odocyá! / Odocyaba!


NANÃ BURUQUÊ
Orixá da lama, das cavernas e da água subterrânea, Nanã Buruquê é a senhora da noite, da magia, da memória e dos conhecimentos ancestrais. Está ligada ao ciclo de morte, vida e ressurreição, sendo responsável por apagar as memórias de uma encarnação para a outra, possibilitando que as experiências vividas não interfiram nessa nova jornada.


Sua energia é lenta, paciente, restritiva, castradora, mantenedora e preservadora. Rege os locais onde a terra e a água se mesclam, como pântanos, lamaçais, e manguezais, nos quais decompõe o que já não tem mais vida, e disponibiliza os nutrientes para serem reaproveitados.


Representa os arquétipos de Anciã (velha sábia) e de Feiticeira. Está ligada à memória (e ao esquecimento), ao inconsciente coletivo, bem como à decantação emocional (águas profundas). Por estar ligada à manutenção das tradições e valores ancestrais, tem dificuldade de aceitar mudanças e agir com ímpeto.


Faz parte dos Orixás de origem no Daomé, sendo anterior aos Orixás Yorubanos. Seu culto é anterior à idade do ferro, razão pela qual muitas tradições não utilizam este metal nos trabalhos dedicados a ela.


Cores: roxo / lilás / anil
Sincretismo: Santa Ana
Elemento: terra (lama) e água (pântanos, manguezais, lagoa e garoa)
Pontos de força: poço, pântano, manguezal, cemitério
Domínios: vida e morte, mistérios profundos, ancestralidade, depuração emocional e energética. 
Símbolo: Ibiri (cetro de hastes de palmeira) 
Ervas: manacá, cebola roxa, manjericão roxo, folha da costa, lírio do brejo
Saudação: Saluba!